- Postulados de terapia narrativa
- 1- Diferenciação do problema e da pessoa
- 2- Influência social e cultural
- 3- O enredo da sua história
- 4- A linguagem como mediadora
- 5- Efeitos da história dominante
- Método narrativo
- Pensamento narrativo VS pensamento lógico-científico
- Experiência pessoal
- Clima
- Língua
- Agência pessoal
- Posição do observador
- Prática
- O processo de re-autoria
- Críticas à terapia narrativa
- Referências
A Terapia Narrativa é um tipo de psicoterapia que se dá a partir de uma perspectiva não invasiva e respeitosa que não culpa ou vitimiza a pessoa, ensinando-lhe que ela é a especialista em sua própria vida.
Surgiu entre os anos 70 e 80 do australiano Michael White e do neozelandês David Epston. É classificado dentro das terapias de terceira geração, também chamadas de terceira onda, juntamente com outros métodos terapêuticos como a Terapia Metacognitiva, a Psicoterapia Analítica Funcional ou a Terapia de Aceitação e Compromisso.
É normalmente utilizado em terapia familiar, embora sua aplicação já tenha sido estendida a outras áreas, como educação e social ou comunitária.
A Terapia Narrativa propõe uma mudança na hora de identificar quem busca ajuda. Para White (2004), ele não é mais chamado de paciente ou cliente, como em outras abordagens terapêuticas, mas é chamado de coautor do processo terapêutico.
Este papel da pessoa durante o processo terapêutico o ajudará a descobrir por si mesmo todas as suas habilidades, capacidades, crenças e valores que o ajudarão a reduzir a influência dos problemas em sua vida.
Assim, os autores, White e Epston, questionam a posição do terapeuta como especialista, cedendo essa posição à pessoa ou coautor, que ajudará o terapeuta a compreender a situação por meio da autodescrição do problema.
Da mesma forma, a Terapia Narrativa busca potencializar a cultura e o conhecimento popular. Segundo White (2002), outras disciplinas esquecem a história das pessoas e grupos sociais, os marginalizam e até mesmo os desqualificam, descartando aqueles valores, recursos e atitudes típicos da cultura utilizada para enfrentar situações problemáticas.
As pessoas tendem a interpretar e dar sentido às experiências do cotidiano para explicar tudo o que acontece e dar sentido. Esse significado pode se tornar o assunto de uma história (narrativa).
Postulados de terapia narrativa
1- Diferenciação do problema e da pessoa
Um dos argumentos em que se baseia a Terapia Narrativa é que a pessoa nunca é o problema e isso é entendido como algo externo à pessoa.
Assim, são analisados os problemas separados das pessoas, pressupondo que elas têm habilidade, capacidade e compromisso para mudar sua relação com os problemas de suas vidas.
A externalização do problema é uma das técnicas mais conhecidas neste tipo de terapia. Consiste na separação linguística do problema e da identidade pessoal do indivíduo.
2- Influência social e cultural
As histórias criadas pelas pessoas para dar sentido às suas experiências são influenciadas por fatores culturais e sociais.
3- O enredo da sua história
No desenvolvimento de uma história, são levados em consideração aqueles eventos que se relacionam por meio de uma sequência temporal e que estão de acordo com o enredo. Assim, o que acontece é interpretado e o sentido é dado por meio da união de certos fatos que vão dar sentido à história.
Esse sentido é o argumento e para alcançá-lo, diferentes fatos e eventos foram escolhidos e outros descartados que, talvez, não se encaixassem no argumento da história.
4- A linguagem como mediadora
Os processos interpretativos são desenvolvidos por meio da linguagem, à medida que pensamentos e sentimentos são definidos.
5- Efeitos da história dominante
As histórias são aquelas que moldam a vida da pessoa e promovem ou impedem a realização de determinados comportamentos, isso é conhecido como efeitos da história dominante.
A vida não pode ser explicada apenas de um ponto de vista, portanto, várias histórias diferentes são vividas ao mesmo tempo. Portanto, as pessoas são consideradas como tendo várias histórias de vida que lhes permitem criar uma história alternativa.
Método narrativo
A Terapia Narrativa utiliza as crenças, habilidades e conhecimentos da pessoa como ferramenta para resolver problemas e recuperar sua vida.
O objetivo do terapeuta narrativo é ajudar os clientes a examinar, avaliar e mudar sua relação com os problemas, fazendo perguntas que ajudem as pessoas a externalizar seus problemas e depois investigá-los.
À medida que mais informações são investigadas e aprendidas sobre os problemas, a pessoa vai descobrindo um conjunto de valores e princípios que fornecerão suporte e uma nova abordagem à vida.
O terapeuta narrativo usa perguntas para orientar as conversas e examinar em profundidade como os problemas influenciaram a vida da pessoa. Partindo da premissa de que embora seja um problema recorrente e grave, ainda não destruiu completamente a pessoa.
Para que a pessoa deixe de ver os problemas como o centro de sua vida, o terapeuta vai encorajar a pessoa a buscar em sua história todos os aspectos que tende a perder e focar sua atenção neles, reduzindo assim a importância dos problemas. Mais tarde, convide a pessoa a assumir uma postura fortalecedora sobre o problema e então reconte a história a partir desse novo ponto de vista.
À medida que a terapia progride, o cliente deve registrar suas descobertas e progresso.
Na Terapia Narrativa, a participação de testemunhas externas ou ouvintes é comum durante as sessões de consulta. Podem ser amigos ou familiares da pessoa ou mesmo ex-clientes do terapeuta que tenham experiência e conhecimento do problema a ser tratado.
Durante a primeira entrevista, apenas o terapeuta e o cliente intervêm, enquanto os ouvintes não podem comentar, apenas ouvir.
Nas sessões subsequentes, eles já conseguem expressar o que se destacam do que foi dito pelo cliente e se isso tem relação com a própria experiência. Posteriormente, será o cliente quem fará o mesmo com o que for relatado por testemunhas externas.
No final, a pessoa percebe que o problema que apresenta é compartilhado por outras pessoas e aprende novas maneiras de continuar com sua vida.
Pensamento narrativo VS pensamento lógico-científico
O pensamento lógico-científico é baseado em procedimentos e teorias endossadas e verificadas pela comunidade científica. Promulga a aplicação de lógica formal, análise rigorosa, descobertas que partem de hipóteses fundamentadas e testadas empiricamente para alcançar teorias e condições de verdade gerais e universais.
Por outro lado, o pensamento narrativo inclui histórias caracterizadas por seu realismo, uma vez que partem da experiência da pessoa. Seu objetivo não é estabelecer condições de verdade ou teorias, mas uma sucessão de eventos ao longo do tempo.
White e Epston (1993) distinguem as diferenças entre os dois tipos de pensamento, concentrando-se em diferentes dimensões:
Experiência pessoal
Os sistemas de classificação e diagnóstico defendidos do ponto de vista lógico-científico, acabam eliminando as particularidades da experiência pessoal. Já o pensamento narrativo dá maior importância à experiência vivida.
De acordo com Turner (1986) “O tipo de estrutura relacional que chamamos de <
Clima
O pensamento lógico-científico não leva em conta a dimensão temporal ao focar na geração de leis universais que são consideradas verdadeiras em todos os tempos e lugares.
Em contraste com isso, a dimensão temporal é fundamental no modo de pensamento narrativo, uma vez que as histórias existem com base no desenvolvimento dos eventos ao longo do tempo. As histórias têm um começo e um fim e entre esses dois pontos é onde o tempo passa. Assim, para que um relato significativo seja dado, os eventos devem seguir uma sequência linear.
Língua
O pensamento lógico-científico faz uso de tecnicismos, eliminando assim a possibilidade de que o contexto influencie os significados das palavras.
Por outro lado, o pensamento narrativo incorpora a linguagem do ponto de vista subjetivo, com o intuito de que cada uma lhe dê um sentido próprio. Também incorpora descrições e expressões coloquiais em oposição à linguagem técnica do pensamento lógico-científico.
Agência pessoal
Já o pensamento lógico-científico identifica o indivíduo como alguém passivo cuja vida se desenvolve a partir da ação das diferentes forças internas ou externas. A modalidade narrativa vê a pessoa como protagonista de seu próprio mundo, capaz de moldar sua vida e seus relacionamentos à vontade.
Posição do observador
O modelo lógico-científico parte da objetividade, portanto, exclui a visão do observador dos fatos.
Por outro lado, o pensamento narrativo dá mais peso ao papel do observador ao considerar que as histórias de vida devem ser construídas a partir do olhar dos protagonistas.
Prática
Segundo White e Epston (1993), a terapia realizada a partir do pensamento narrativo:
- Ele dá a maior importância às experiências da pessoa.
- Favorece a percepção de um mundo em mudança ao situar as experiências vividas na dimensão temporal.
- Ele invoca o modo subjuntivo, acionando pressuposições, estabelecendo significados implícitos e gerando múltiplas perspectivas.
- Estimula a diversidade de significados das palavras e o uso da linguagem coloquial, poética e pitoresca na descrição de experiências e na tentativa de construção de novas histórias.
- Convida você a adotar uma postura reflexiva e valorizar a participação de cada um nos atos interpretativos.
- Ele promove um senso de autoria e re-autoria da própria vida e relacionamentos, contando e recontando a própria história.
- Ele reconhece que as histórias são coproduzidas e tenta estabelecer condições nas quais o "objeto" se torne um autor privilegiado.
- Sempre introduza os pronomes "eu" e "você" na descrição dos eventos.
O processo de re-autoria
Segundo White (1995), o processo de re-autoria ou reescrita de vida é um processo colaborativo no qual os terapeutas devem realizar as seguintes práticas:
- Adote uma posição de coautoria colaborativa.
- Ajude os clientes a se verem separados de seus problemas por meio da terceirização.
- Ajude os clientes a relembrar aqueles momentos de suas vidas em que não se sentiram oprimidos por seus problemas, os chamados eventos extraordinários.
- Expanda as descrições desses eventos extraordinários com perguntas sobre a "paisagem da ação" e a "paisagem da consciência".
- Conecte os eventos extraordinários a outros eventos do passado e estenda essa história para o futuro para formar uma narrativa alternativa na qual o self é visto como mais poderoso do que o problema.
- Convide membros importantes de sua rede social para testemunhar essa nova narrativa pessoal.
- Documente essas novas práticas e percepções que apóiam essa nova narrativa pessoal por meio de meios literários.
- Permitir que outras pessoas, presas por narrativas opressivas idênticas, se beneficiem desse novo conhecimento por meio de práticas de recebimento e retorno.
Críticas à terapia narrativa
A Terapia Narrativa é alvo de muitas críticas devido, entre outras coisas, à sua inconsistência teórica e metodológica:
- É criticado por manter uma crença construcionista social de que não existem verdades absolutas, mas pontos de vista socialmente sancionados.
- Existe a preocupação de que os gurus da Terapia Narrativa sejam muito críticos de outras abordagens terapêuticas, tentando fundamentar seus postulados.
- Outros criticam que a Terapia Narrativa não leva em consideração os preconceitos e opiniões pessoais que o terapeuta narrativo possui durante as sessões de terapia.
- Também é criticado pela falta de estudos clínicos e empíricos para validar suas afirmações. Nesse sentido, Etchison e Kleist (2000) defendem que os resultados qualitativos da Terapia Narrativa não são congruentes com os achados da maioria dos estudos empíricos realizados, carecendo, portanto, de embasamento científico que sustente sua eficácia.
Referências
- Carr, A., (1998), Michael White's Narrative Therapy, Contemporary Family Therapy, 20, (4).
- Freedman, Jill e, Combs, Gene (1996). Terapia narrativa: a construção social de realidades preferidas. Nova York: Norton. ISBN 0-393-70207-3.
- Montesano, A., A perspectiva narrativa em terapia familiar sistémica, Revista de Psicoterapia, 89, 13, 5-50.
- Tarragona, M., (2006), Terapias pós-modernas: uma breve introdução à terapia colaborativa, terapia narrativa e terapia focada na solução, Psicologia Comportamental, 14, 3, 511-532.
- Payne, M. (2002) Narrative Therapy. Uma introdução para profissionais. Barcelona: Paidós.
- White, M. (2007). Mapas de prática narrativa. NY: WW Norton. ISBN 978-0-393-70516-4
- White, M., Epston, D., (1993), Narrative media forapeutic purpose, 89-91, Barcelona: Paidós.