O operon lac é um grupo de genes estruturais cuja função é codificar proteínas envolvidas no metabolismo da lactose. Eles são genes ordenados consecutivamente no genoma de quase todas as bactérias e foram estudados com especial esforço na bactéria "modelo" Escherichia coli.
O operon lac foi o modelo usado por Jacob e Monod em 1961 para propor arranjos genéticos na forma de um operon. Em seu trabalho, esses autores descreveram como a expressão de um ou mais genes poderia ser “ligada” ou “desligada” em decorrência da presença de uma molécula (lactose, por exemplo) no meio de crescimento.
Esquema geral do operon lac. Tereseik. Trabalho derivado da imagem G3pro. Tradução para o espanhol de Alejandro Porto.
Bactérias que crescem em meios de crescimento ricos em compostos carbonáceos ou açúcares diferentes da lactose, como glicose e galactose, possuem quantidades muito baixas das proteínas necessárias para a metabolização da lactose.
Então, na ausência de lactose, o operon é "desligado", evitando que a RNA polimerase transcreva o segmento gênico correspondente ao operon lac. Quando a célula “sente” a presença de lactose, o operon é ativado e esses genes são transcritos normalmente, o que é conhecido como “ligar” o operon.
Todos os genes do operon são traduzidos em uma única molécula de RNA mensageiro e, portanto, qualquer fator que regule a transcrição desse RNA mensageiro do operon lac irá regular diretamente a transcrição de qualquer gene que pertença a ele.
Descoberta
A teoria de Jacob e Monod se desenvolveu em um contexto em que muito pouco se sabia sobre a estrutura do DNA. E isso aconteceu apenas oito anos antes de Watson e Crick terem feito sua proposta sobre a estrutura do DNA e do RNA, de modo que os RNAs mensageiros quase não eram conhecidos.
Jacob e Monod, na década de 1950, já haviam demonstrado que o metabolismo da lactose bacteriana era geneticamente regulado por duas condições muito específicas: a presença e a ausência de lactose.
Ambos os cientistas observaram que uma proteína com características semelhantes a uma enzima alostérica era capaz de detectar a presença de lactose no meio e que, uma vez detectado o açúcar, a transcrição de duas enzimas era estimulada: uma lactose permease e uma galactosidase.
Hoje se sabe que a permease desempenha um papel no transporte da lactose para a célula e que a galactosidase é necessária para “quebrar” ou “cortar” a molécula de lactose em glicose e galactose, para que a célula pode tirar vantagem deste dissacarídeo em suas partes constituintes.
Na década de 1960, já havia sido determinado que a lactose permease e a galactosidase eram codificadas por duas sequências genéticas adjacentes, a região Z e a região Y, respectivamente.
O operon lac é parte do genoma da bactéria Escherichia coli. Fonte: NIAID, via Wikimedia Commons
Finalmente, em 1961, Jacob e Monod apresentaram um modelo genético composto de cinco elementos genéticos:
- Um promotor
- Uma operadora e
- genes Z, Y e A.
Todos esses segmentos são traduzidos em um único RNA mensageiro e constituem as partes essenciais para definir praticamente qualquer operon bacteriano na natureza.
Análise genética e experimentos
Jacob, Monod e seus colaboradores conduziram muitos experimentos com células bacterianas que tinham mutações que tornavam as cepas incapazes de metabolizar a lactose. Essas cepas foram identificadas pelo nome da cepa e a mutação correspondente que possuíam.
Dessa forma, os pesquisadores conseguiram identificar que mutações nos genes lacZ, que codifica a β-galactosidase, e lacY, que codifica a lactose permease, produziam bactérias do tipo lac, ou seja, bactérias incapazes de metabolizar a lactose..
A partir do “mapeamento genético” com enzimas de restrição, foi posteriormente determinada a localização dos genes nas diferentes cepas, fato que permitiu estabelecer que os três genes lacZ, lacY e lacA são encontrados (nessa ordem) no cromossomo bacteriano em um grupo de genes adjacentes.
A existência de outra proteína, denominada proteína repressora, que não é necessariamente considerada como uma "parte" do operon, foi elucidada por meio de mutações em um gene denominado lacI-. Ele codifica uma proteína que se liga à região "operadora" no operon e evita a transcrição dos genes da β-galactosidase e da lactose permease.
Diz-se que essa proteína não faz parte dos genes que compõem o operon lac, pois na verdade estão localizados "a montante" deste e são transcritos em diferentes RNAs mensageiros.
Esquema do operon lac (Fonte: Barbarossa na Wikipedia holandesa via Wikimedia Commons)
As cepas bacterianas que possuem a mutação lacI- expressam "constitutivamente" os genes lacZ, lacY e lacA, o que ocorre independentemente da presença ou ausência de lactose no ambiente extracelular.
Muitas dessas observações foram corroboradas pela transferência dos genes lacI + e lacZ + para uma célula bacteriana que não produziu as proteínas codificadas por esses genes em um meio sem lactose.
Uma vez que as bactérias "transformadas" desta forma apenas produziram a enzima β-galactosidase na presença de lactose, a experiência confirmou que o gene lacI era importante para a regulação da expressão do operão lac.
Função
O operon lac regula a transcrição de genes que são necessários para que as bactérias assimilem a lactose como fonte de carbono e energia. No entanto, a transcrição desses genes só ocorre quando a principal fonte de energia corresponde aos carboidratos do tipo galactosídeo.
Nas células bacterianas, existem mecanismos que regulam a expressão dos genes do operon lac quando estão na presença de glicose ou de qualquer outro açúcar mais fácil de metabolizar.
A metabolização desses açúcares envolve seu transporte para o interior da célula e sua decomposição ou processamento subsequente.
A lactose é usada como uma fonte alternativa de energia para bactérias, ajudando-as a sobreviver mesmo depois que outras fontes de energia no ambiente, como a glicose, se esgotam.
O modelo de operon lac foi o primeiro sistema genético desse tipo a ser elucidado e, portanto, serviu de base para a descrição de muitos outros operons no genoma de diferentes tipos de microrganismos.
Com o estudo desse sistema, muito progresso foi feito no entendimento do funcionamento das proteínas do tipo "repressor" que se ligam ao DNA. Também houve progresso no entendimento das enzimas alostéricas e como elas agem seletivamente ao reconhecer um ou outro substrato.
Outro avanço importante que surgiu com o estudo do operon lac foi o estabelecimento do papel crucial que os RNAs mensageiros desempenham na tradução das instruções encontradas no DNA e também como etapa prévia à síntese protéica.
Referências
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